Resumo do texto de sobre Redes Mesh apresentado no SBrT 2007
Clayton Reis da Silva (creis@ic.uff.br)
1) Introdução
Apesar do Brasil ser o primeiro país da América Latina e o quinto no mundo em números de usuários da Internet, ele é o quarto na América Latina e o sexagésimo segundo no mundo considerando o percentual da população que usa a rede.
O serviço de telefonia fixa não está disponível em todos os domicílios brasileiros e,
mesmo se estivesse, o acesso banda larga cabeado, através de xDSL ou redes de TV a cabo, ainda tem custos muito altos para a grande maioria da população.
Logo identifica-se a necessidade de novas soluções de acesso à Internet de baixo custo, principalmente para as comunidades que moram em áreas sem infra-estrutura
de comunicação cabeada.
O trabalho apresentado propõe o uso de redes em malha sem fio (redes mesh) como solução para o problema da popularização do acesso à Internet em várias comunidades brasileiras. Neste tipo de rede, roteadores sem fio se comunicam uns com os
outros no modo ad-hoc utilizando múltiplos saltos para encaminhar mensagens ao destino apropriado.
Redes mesh têm várias vantagens, incluindo baixo custo, implantação incremental e tolerância a falhas. Através de pesquisa e desenvolvimento de uma solução para redes em malha de baixo custo, baseada em software livre, que vem sendo realizada no escopo do projeto ReMesh em parceria com a RNP (Rede Nacional de Pesquisa), a UFF – Universidade Federal Fluminense – vem oferecendo, desde 2006, acesso banda larga gratuito à Internet para a comunidade universitária que mora nas proximidades do Campus Praia Vermelha, na cidade de Niterói, RJ, Brasil.
2) Trabalhos Relacionados
Existem vários projetos pilotos de redes mesh ao redor do mundo. Há projetos acadêmicos, como: RoofNet no MIT, VMesh na Grécia, MeshNet na UCSB, CUWin em Urbana , Microsoft Mesh, entre outros; e soluções comerciais, oferecidas por grandes empresas, como Nortel e Cisco, e por pequenas empresas também.
Uma grande desvantagem dos roteadores mesh comerciais é o seu alto custo, impraticável para usuários finais comuns. A solução Remesh proposta neste trabalho, como as de, é baseada no sistema operacional linux, com código aberto e utiliza um roteador sem fio de baixo custo.
Os custos dos enlaces sem fio, usados para descoberta das melhores rotas, podem ser calculados usando a contagem de saltos tradicional, o tempo de ida e volta por salto, retardos entre pares de pacotes, a métrica ETX (Expected Transmission Count) ou métricas similares derivadas, tal como ETT (Expected Transmission Time) e WCETT
(Weighted Cumulative Expected Transmission Time). A métrica ETX mede dinamicamente a qualidade dos enlaces sem fio e como é usada pela solução ReMesh, será explicada em detalhes mais adiante. A métrica ETT prevê o tempo total para enviar um pacote ao longo de uma rota, considerando a taxa de transmissão máxima de cada enlace e a probabilidade de recepção usando essa taxa. O protocolo de roteamento usado por RoofNet escolhe a rota de menor ETT. WCETT leva em consideração a interferência entre enlaces que utilizam o mesmo canal. A métrica OLSR-ML desenvolvida pelo projeto ReMesh, baseada em ETX, mostra que escolher enlaces com taxa de perda mínima, leva a alta vazão, com o benefício adicional de manter as rotas mais
estáveis e obter taxas de perda mais baixas.
3) Solução ReMesh para redes em malha
Os roteadores mesh sem fio são instalados no topo dos edifícios ou casas dos usuários da comunidade. Através de conexão ethernet ou wifi, os usuários interligam suas estações pessoais ao roteador de sua residência, e através de uma malha sem fio em múltiplos saltos, os roteadores se comunicam com o(s) gateway(s) para Internet, sendo este(s) instalado(s) no topo de um dos prédios da instituição que possui acesso à Internet. O gateway se comunica com um servidor de autenticação, que através do software aberto wifidog (captive portal) realiza o controle de acesso à rede mesh. Só os usuários cadastrados têm acesso à rede, depois de se autenticarem.
O projeto ReMesh também desenvolveu ferramentas de gerência que permitem acompanhar em tempo real a qualidade dos enlaces sem fio, exibindo graficamente a visualizaçao da topologia da rede. Estas ferramentas facilitam a identificação de falhas e manutenção da rede mesh. A ferramenta gráfica foi desenvolvida utilizando o padrão SVG
(Scalable Vector Graphics) do W3C, baseado em XML. Além de exibir a topologia, o mapa é interativo, permitindo que o usuário clique em cada nó da rede e visualize o resultado gerado pelo software MRTG (Multi Router Traffic Grapher), que mostra o tráfego que passa por cada roteador.
4) Roteador sem fio de baixo custo
Uma das vantagens da solução ReMesh é o custo baixo dos equipamentos necessários para montar a malha sem fio. O custo atual de cada nó mesh sai por menos de US$ 500, enquanto os seus concorrentes comerciais cobram alguns milhares de dólares por cada nó.
O roteador utilizado é o WRT54G, da Linksys. Trata-se de um roteador wireless 802.11g com 4 MB de memória flash (permanente) e 8 MB de memória RAM. Além de ponto de acesso, ele rotea os clientes ligados a ele tanto pela interface sem fio como pelas suas cinco portas ethernet presentes. O roteador vem de fábrica com um sistema operacional da própria Linksys que possui uma interface de administração via web. A adaptação para transformá-lo em um roteador mesh é feita com a instalação do firmware desenvolvido pelo ReMesh, baseado em OpenWRT.
Para a montagem de cada nó da rede, pronto para ser instalado em ambientes externos, utilizamos ainda outros componentes para proteção do roteador e suporte da antena, que pode ser uma antena omni-direcional de 18,5 dbi de ganho ou uma antena direcional de 24 dbi de ganho, além dos cabos e conectores necessários. Há ainda o módulo POE (Power Over Ethernet) desenvolvido pelo próprio ReMesh, que evita a passagem de outro cabo de alimentação para o roteador.
Além do roteador e das peças de montagem para o ambiente externo, é necessário um servidor para oferecer o serviço de autenticação e coleta de estatísticas de acesso (através do software wifidog) e também o serviço web, onde executamos as ferramentas de gerência dos nós e da qualidade dos links.
5) Protocolo de roteamento OLSR-ML
A métrica mais comum utilizada para calcular rotas ótimas na maioria dos protocolos de roteamento ad-hoc existentes, incluindo a própria especificação padronizada do protocolo de roteamento OLSR, é a quantidade de saltos mínima. Entretanto, minimizar a quantidade de saltos somente não é suficiente em um ambiente sem fio, pois quando a rede é densa, podem existir diversas rotas com o mesmo comprimento em número de saltos e diferentes qualidades em cada caminho. A implementação do OLSR utiliza uma métrica que mede a qualidade dos enlaces, chamada ETX. Essa extensão tenta encontrar caminhos com o menor número de transmissões necessárias para entregar um pacote ao seu destino final.
A métrica ETX de um enlace é calculada usando as taxas de recepção de pacotes em ambos os sentidos do enlace. A taxa de recepção é a probabilidade com que um pacote de dados chegue no próximo nó do caminho. A probabilidade esperada com que uma transmissão seja recebida com sucesso e seja reconhecida é o produto entre taxa de recepção de ida (df) e a taxa de recepção de volta (dr) do enlace. Logo, o valor da métrica ETX é dado por: ETX = 1 / (df x dr).
Quanto pior a qualidade do enlace, maior o valor de ETX. O valor mínimo de ETX é 1 em um enlace perfeito e pode ser 0 somente se nenhum pacote for recebido durante um período de t segundos.
No caso de um caminho com múltiplos saltos, o valor de ETX da rota completa é dado pelo soma do valor de ETX de cada salto. O protocolo OLSR seleciona como melhor rota, de uma origem a um destino específico, aquela que tem o menor valor de ETX.
Usando o protocolo OLSR com a extensão ETX original, vivenciamos instabilidade nas tabelas de rotas e altas taxas de perda de pacotes na rede do projeto ReMesh. Para melhorar o desempenho da rede, O ReMesh propõe uma maneira alternativa para calcular a qualidade de um dado caminho com o objetivo de selecionar a rota com a menor probabilidade de perda de pacotes, batizada de OLSR-ML (minimum loss).
Interpretando as taxas de recepção dos enlaces como probabilidades, como foram originalmente definidas, a probabilidade de transmissão com sucesso de A até B é: PAB = (df x dr).
Em um caminho com múltiplos saltos, a probabilidade de transmissão com sucesso em todo o caminho deveria ser o produto das probabilidades de cada salto.
Dessa forma, em nossa proposta, o valor da medida de qualidade de um caminho com múltiplos saltos é dado pelo produto do valor da medida de qualidade de cada salto e não pela soma de todos eles, como na proposta original. Como estamos usando a probabilidade P e não seu valor inverso (ETX), a melhor rota de uma origem a um destino específico é aquela com a maior probabilidade (P) de transmissão com sucesso, ou seja, aquela com a menor probabilidade de perda de pacotes.
Usando esta abordagem, poderíamos questionar que se todas as medidas de qualidade fossem iguais a 1, então a probabilidade de transmissão com sucesso em um caminho com múltiplos saltos, entre dois nós, seria mesma que a probabilidade em um enlace direto entre eles. Isto é verdade, porém a implementação do OLSR já fornece uma solução para esse cenário. Quando múltiplas rotas com a mesma medida de qualidade são encontradas, aquela com a menor quantidade de saltos é a escolhida. Então, o enlace direto seria escolhido neste caso.
Por outro lado, se um caminho com múltiplos saltos tem probabilidade de transmissão com sucesso maior (ou probabilidade de perda de pacotes menor) que um caminho direto, o caminho com mais saltos é escolhido. Resultados de testes de desempenho, feitos em nosso ambiente, indicam que a nova proposta melhorou o desempenho da rede mesh em relação à estabilidade das rotas, taxas de perda de pacotes, retardos de ida e volta e vazão.
6) Conclusões
Redes mesh sem fio comunitárias estão se tornando uma solução atraente para oferecer acesso banda larga de baixo custo à Internet e outros serviços, tais como computação ubíqua e telefonia IP sobre redes sem fio. O projeto ReMesh tem o objetivo de incluir digitalmente a comunidade acadêmica da UFF, através do oferecimento de acesso banda larga para as vizinhanças ao redor dos campi da universidade. A solução apresentada neste trabalho é uma possibilidade real para popularização do acesso a Internet em pequenos municípios e comunidades carentes espalhadas pelo nosso país.
Como trabalhos futuros, estão sendo investigados o oferecimento de qualidade de serviço, comunicação em grupo e mobilidade em redes mesh e pretende-se incluir estas facilidades na solução ReMesh.